Ruth Soares - Patrono: Tomás Antonio Gonzaga
Não foi um movimento de elite endividada, que tentava se livrar do erário português. Foi um movimento de convicções políticas, quando os colonizados fizeram oscilar o equilíbrio do colonizador. O povo de Minas Gerais, sempre insubmisso, mantinha os governantes da capitania em alerta. A insatisfação corroia a paz desta região aurífera, onde a maioria da população acalentava o sonho de liberdade.
Foi aí, nesse pedaço de chão, rico em ouro e diamantes que nasceu o movimento libertário denominado Inconfidência Mineira. A metrópole tudo fez para anular o sonho dos mineiros; criou a capitania de São Paulo e Minas do Ouro, retirando a jurisdição do Rio de Janeiro com a intenção de garantir a arrecadação dos impostos aos mineiros. Devido a essa cobrança exagerada, muitas revoltas aconteceram nas montanhas de Minas Gerais: em 1718 aconteceu a Revolta de Pitangui contra a cobrança em atraso das oitavas de ouro, Minas Gerais deveria repassar à coroa portuguesa 25 arrobas de ouro, o que equivaleria a 375 kg anuais. Em 1720, aconteceu em Vila Rica, uma rebelião chefiada por Felipe dos Santos (um reinol) contra o estabelecimento das Casas de Fundição, além do excesso de impostos cobrados sobre alimentos e instrumentos necessários para a mineração. Essa revolta de Felipe dos Santos foi tão séria, que levou a coroa a repensar a divisão do território brasileiro, desmembrando a capitania das Minas Gerais da de São Paulo, criando a capitania Real de Minas Gerais. Em 1736 surgem novas rebeliões como as Sedições de São Francisco, contra o sistema de captação de impostos. Em 1761, aconteceu a “Inconfidência de Curvelo”, protesto contra a expulsão dos jesuítas, a mando do Marquês de Pombal e do rei D. José I.
Para a historiadora Maria Efigênia Lage Rezende a Inconfidência Mineira já estava em curso desde 1786, elaborada na mente e no coração de estudantes brasileiros, que cursavam as Universidades européias: José Joaquim da Maia estudante de medicina na França, escreveu a Thomas Jefferson, embaixador dos E.U.A. no país, solicitando apoio à causa da independência brasileira. Além dele, outro estudante brasileiro que também lutou pelos ideais de uma nação livre, foi José Álvares Maciel, filho do capitão-mor de Vila Rica que incutiu em Tiradentes e seus companheiros os ideais liberais. Em 1788 as minas de ouro estavam exauridas. Em Portugal, morre o rei D. José I e sobe ao trono D. Maria I, que substituiu o ministro Marquês de Pombal por D. Martinho de Melo e Castro, que considerava o não pagamento das 100 arrobas de ouro como sonegação de impostos por parte dos mineiros. Mais severo que Pombal no cumprimento das leis, Dom Martinho mandou fechar as fábricas de manufaturas em território nacional, para que o comércio desses produtos beneficiasse os comerciantes portugueses que viviam em Portugal.
Melo e Castro recomendou ao Visconde de Barbacena que completasse 100 arrobas de ouro para o pagamento dos impostos; caso não se completasse, proceder-se ia à derrama. Alguns impostos cobrados naquele período desapareceram de nosso código legal, mas podemos encontrá-los em países europeus sede de monarquias. Contrato de entradas; direito de passagem; contrato de dízimo; imposto sobre produção em geral; subsídios voluntários (10 anos para reconstruir Lisboa) subsídio literário; terças partes dos ofícios (arrecadados sobre vendas de cargos públicos); imposto sobre carne verde; sobre cada litro de vinho; taxas de correios; contribuição do Tejuco. Indignado com essa carga abusiva de impostos, Tomás Antônio Gonzaga,manifestou sua revolta através das cartas chilenas, denunciando o quadro de penúria do povo, a opressão fiscal, as arbitrariedades, a corrupção e as promoções injustas existentes na capitania.
Foi nesse ambiente corrupto e opressivo que nasceu e cresceu o sonho de liberdade dos Inconfidentes. O ouro fez nascer povoações como o Arraial Novo, Arraial Velho do Rio das Mortes, Vilas de São José Del Rei, atual Tiradentes, e São João Del Rei. Nessa região, à direita do Rio das Mortes, ficava o sítio de Pombal onde nasceu Joaquim José da Silva Xavier. Era o 4º filho de Domingos da Silva Santos e Antonia Encarnação Xavier de uma prole de sete filhos; seu padrinho foi Sebastião Ferreira Leitão. Dois de seus irmãos se tornaram padres, um seguiu a carreira militar. Joaquim José possuía cultura maior que a média da população da época, redigia bem e tinha boa caligrafia. Gostava de estudar e com a ajuda de seu padrinho, tornou-se hábil dentista prático; conhecia a flora e a fauna brasileira e com curandeiros aprendeu medicina alternativa. Tinha espírito aventureiro, foi tropeiro por nove anos, desbravando os sertões de Minas Gerais e Bahia, viu a miséria do povo, visualizou as riquezas brasileiras que eram levadas para fora do Brasil. Decidiu abraçar a carreira militar incorporando-se à companhia de Dragões de Vila Rica. Foi confirmado no posto de Alferes, vinculado à 6ª Cia sob o comando do capitão Baltazar João Mayrink, pai de Maria Dorotéia Joaquina de Seixas imortalizada por Tomás Antônio Gonzaga, como Marília de Dirceu.
Tiradentes era branco, simpático e agradável. Não era figura banal nem desagradável. Como não tivemos acesso a nenhuma foto ou pintura que o retratasse, sua imagem no século XIX foi idealizada à semelhança da imagem de Jesus Cristo e assim difundida pela República. O herói da Inconfidência Mineira não se casou, uniu-se a uma jovem com idade provável entre 16 e 17 anos: Antonia Maria do Espírito Santo. Com ela teve uma filha a quem batizaram com o nome de Joaquina; foi seu padrinho Domingos Abreu Vieira, também um inconfidente. Tinha uma situação financeira equilibrada, seu salário era de 142 $350 réis e, além disso, ainda tinha vencimentos auferidos no exercício da odontologia prática, e da medicina alternativa. Recebeu também, uma pequena herança. Quando foi preso, todos os seus bens foram confiscados pela coroa portuguesa.
Além do conhecimento de medicina e odontologia possuía conhecimentos de engenharia. No Rio de Janeiro fez um projeto para captação de águas do córrego do Catete e do rio Andaraí para edificação de moinhos e abastecimentos de água na cidade. Este projeto ficou arquivado na Câmara do Rio de Janeiro e sequer foi analisado pelas autoridades da época; não mereceu nenhum despacho, até a vinda do Príncipe Dom João VI, que se encarregou de mandar executá-lo. Nesse contexto, vale lembrar as bravas figuras do padre Rolim e padre Toledo, inconfidentes que comandaram pelo menos 200 homens armados durante a revolução.
Tiradentes morreu por sonhar com uma nação livre, um país grandioso, soberano, administrado por seu povo, dono de suas riquezas. Em razão desse sonho foi perseguido, preso e condenado. Seu corpo foi esquartejado e exibido pelas montanhas mineiras onde os pedaços foram expostos nos locais em que ele pregou a liberdade.
Hoje, 200 anos depois, os sonhos de Tiradentes continuam a ser sonhos.
Dados Bibliográficos:
GONÇALVES, Adelton. Gonzaga, Um poeta do Iluminismo – Nova Fronteira.
SOUZA, Miguel Augusto Gonçalves. Revista da AML – 1981 Vol: XXVIII e XXIX.
RESENDE, Maria Efigênia Lage, Inconfidência Mineira – 3ª edição. 1986 – Global Editora – História Popular. São Paulo.
SANT´ANNA, Sonia. Inconfidências Mineiras – Uma História Privada da Inconfidência. Editora Jorge Zahar
LOPES, Paulo Guilherme M. O processo de Tiradentes. Conjur Editorial – Ricardo Tosto – Apresentação Aécio Neves. Pág. 5.
Não foi um movimento de elite endividada, que tentava se livrar do erário português. Foi um movimento de convicções políticas, quando os colonizados fizeram oscilar o equilíbrio do colonizador. O povo de Minas Gerais, sempre insubmisso, mantinha os governantes da capitania em alerta. A insatisfação corroia a paz desta região aurífera, onde a maioria da população acalentava o sonho de liberdade.
Foi aí, nesse pedaço de chão, rico em ouro e diamantes que nasceu o movimento libertário denominado Inconfidência Mineira. A metrópole tudo fez para anular o sonho dos mineiros; criou a capitania de São Paulo e Minas do Ouro, retirando a jurisdição do Rio de Janeiro com a intenção de garantir a arrecadação dos impostos aos mineiros. Devido a essa cobrança exagerada, muitas revoltas aconteceram nas montanhas de Minas Gerais: em 1718 aconteceu a Revolta de Pitangui contra a cobrança em atraso das oitavas de ouro, Minas Gerais deveria repassar à coroa portuguesa 25 arrobas de ouro, o que equivaleria a 375 kg anuais. Em 1720, aconteceu em Vila Rica, uma rebelião chefiada por Felipe dos Santos (um reinol) contra o estabelecimento das Casas de Fundição, além do excesso de impostos cobrados sobre alimentos e instrumentos necessários para a mineração. Essa revolta de Felipe dos Santos foi tão séria, que levou a coroa a repensar a divisão do território brasileiro, desmembrando a capitania das Minas Gerais da de São Paulo, criando a capitania Real de Minas Gerais. Em 1736 surgem novas rebeliões como as Sedições de São Francisco, contra o sistema de captação de impostos. Em 1761, aconteceu a “Inconfidência de Curvelo”, protesto contra a expulsão dos jesuítas, a mando do Marquês de Pombal e do rei D. José I.
Para a historiadora Maria Efigênia Lage Rezende a Inconfidência Mineira já estava em curso desde 1786, elaborada na mente e no coração de estudantes brasileiros, que cursavam as Universidades européias: José Joaquim da Maia estudante de medicina na França, escreveu a Thomas Jefferson, embaixador dos E.U.A. no país, solicitando apoio à causa da independência brasileira. Além dele, outro estudante brasileiro que também lutou pelos ideais de uma nação livre, foi José Álvares Maciel, filho do capitão-mor de Vila Rica que incutiu em Tiradentes e seus companheiros os ideais liberais. Em 1788 as minas de ouro estavam exauridas. Em Portugal, morre o rei D. José I e sobe ao trono D. Maria I, que substituiu o ministro Marquês de Pombal por D. Martinho de Melo e Castro, que considerava o não pagamento das 100 arrobas de ouro como sonegação de impostos por parte dos mineiros. Mais severo que Pombal no cumprimento das leis, Dom Martinho mandou fechar as fábricas de manufaturas em território nacional, para que o comércio desses produtos beneficiasse os comerciantes portugueses que viviam em Portugal.
Melo e Castro recomendou ao Visconde de Barbacena que completasse 100 arrobas de ouro para o pagamento dos impostos; caso não se completasse, proceder-se ia à derrama. Alguns impostos cobrados naquele período desapareceram de nosso código legal, mas podemos encontrá-los em países europeus sede de monarquias. Contrato de entradas; direito de passagem; contrato de dízimo; imposto sobre produção em geral; subsídios voluntários (10 anos para reconstruir Lisboa) subsídio literário; terças partes dos ofícios (arrecadados sobre vendas de cargos públicos); imposto sobre carne verde; sobre cada litro de vinho; taxas de correios; contribuição do Tejuco. Indignado com essa carga abusiva de impostos, Tomás Antônio Gonzaga,manifestou sua revolta através das cartas chilenas, denunciando o quadro de penúria do povo, a opressão fiscal, as arbitrariedades, a corrupção e as promoções injustas existentes na capitania.
Foi nesse ambiente corrupto e opressivo que nasceu e cresceu o sonho de liberdade dos Inconfidentes. O ouro fez nascer povoações como o Arraial Novo, Arraial Velho do Rio das Mortes, Vilas de São José Del Rei, atual Tiradentes, e São João Del Rei. Nessa região, à direita do Rio das Mortes, ficava o sítio de Pombal onde nasceu Joaquim José da Silva Xavier. Era o 4º filho de Domingos da Silva Santos e Antonia Encarnação Xavier de uma prole de sete filhos; seu padrinho foi Sebastião Ferreira Leitão. Dois de seus irmãos se tornaram padres, um seguiu a carreira militar. Joaquim José possuía cultura maior que a média da população da época, redigia bem e tinha boa caligrafia. Gostava de estudar e com a ajuda de seu padrinho, tornou-se hábil dentista prático; conhecia a flora e a fauna brasileira e com curandeiros aprendeu medicina alternativa. Tinha espírito aventureiro, foi tropeiro por nove anos, desbravando os sertões de Minas Gerais e Bahia, viu a miséria do povo, visualizou as riquezas brasileiras que eram levadas para fora do Brasil. Decidiu abraçar a carreira militar incorporando-se à companhia de Dragões de Vila Rica. Foi confirmado no posto de Alferes, vinculado à 6ª Cia sob o comando do capitão Baltazar João Mayrink, pai de Maria Dorotéia Joaquina de Seixas imortalizada por Tomás Antônio Gonzaga, como Marília de Dirceu.
Tiradentes era branco, simpático e agradável. Não era figura banal nem desagradável. Como não tivemos acesso a nenhuma foto ou pintura que o retratasse, sua imagem no século XIX foi idealizada à semelhança da imagem de Jesus Cristo e assim difundida pela República. O herói da Inconfidência Mineira não se casou, uniu-se a uma jovem com idade provável entre 16 e 17 anos: Antonia Maria do Espírito Santo. Com ela teve uma filha a quem batizaram com o nome de Joaquina; foi seu padrinho Domingos Abreu Vieira, também um inconfidente. Tinha uma situação financeira equilibrada, seu salário era de 142 $350 réis e, além disso, ainda tinha vencimentos auferidos no exercício da odontologia prática, e da medicina alternativa. Recebeu também, uma pequena herança. Quando foi preso, todos os seus bens foram confiscados pela coroa portuguesa.
Além do conhecimento de medicina e odontologia possuía conhecimentos de engenharia. No Rio de Janeiro fez um projeto para captação de águas do córrego do Catete e do rio Andaraí para edificação de moinhos e abastecimentos de água na cidade. Este projeto ficou arquivado na Câmara do Rio de Janeiro e sequer foi analisado pelas autoridades da época; não mereceu nenhum despacho, até a vinda do Príncipe Dom João VI, que se encarregou de mandar executá-lo. Nesse contexto, vale lembrar as bravas figuras do padre Rolim e padre Toledo, inconfidentes que comandaram pelo menos 200 homens armados durante a revolução.
Tiradentes morreu por sonhar com uma nação livre, um país grandioso, soberano, administrado por seu povo, dono de suas riquezas. Em razão desse sonho foi perseguido, preso e condenado. Seu corpo foi esquartejado e exibido pelas montanhas mineiras onde os pedaços foram expostos nos locais em que ele pregou a liberdade.
Hoje, 200 anos depois, os sonhos de Tiradentes continuam a ser sonhos.
Dados Bibliográficos:
GONÇALVES, Adelton. Gonzaga, Um poeta do Iluminismo – Nova Fronteira.
SOUZA, Miguel Augusto Gonçalves. Revista da AML – 1981 Vol: XXVIII e XXIX.
RESENDE, Maria Efigênia Lage, Inconfidência Mineira – 3ª edição. 1986 – Global Editora – História Popular. São Paulo.
SANT´ANNA, Sonia. Inconfidências Mineiras – Uma História Privada da Inconfidência. Editora Jorge Zahar
LOPES, Paulo Guilherme M. O processo de Tiradentes. Conjur Editorial – Ricardo Tosto – Apresentação Aécio Neves. Pág. 5.
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